quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Tic tac... tic tac... tic tac...

Foto: L.S.
Tenho feito posts bastante voltados a tipos humanos... Não que isso seja algo proposital. Na verdade, a lauda – eletrônica ou celulósica – sempre me concede a liberdade natural da franca Literatura! E o faço com a fluidez de nuances variadas que surgem espontaneamente, sem correntes ou correntezas...
E hoje a minha lauda quer falar do tempo e seus distintivos, os amigos – para alguns, opressores?! – relógios e similares.
Tic tac... tic tac... tic tac...
Não se trata de uma simples onomatopéia. Nem daquelas balas branquinhas de progressivas mudanças de sabor, da famosa doceria italiana. É, na verdade, o alarido estridente de um relógio pequeno, mas desastroso, que veio parar em meu quarto. Por quatro ou cinco noites até convivi com o intruso... Mas lá pela quinta ou sexta – irritada que estava com o tic tac constante –, olhei para ele com aquele olhar de fulminância, levantei-me no ímpeto e avancei sobre a “criatura”! Alcancei-o como a uma presa indefesa e o retirei do criado-mudo, levando-o para o ponto mais distante possível de meus tímpanos não menos irritados que afetados. Saí pela casa com uma postura quase maquiavélica de quem estuda todas as possibilidades de se livrar de um fenômeno indesejado. Juro que entendi a obsessão do Capitão Gancho (nunca pensei que pudesse estabelecer qualquer empatia com ele.. tsc tsc tsc)... Parecia mesmo que ouvia o tal crocodilo com o relógio na barriga o tempo todo! Um horror!
Mas o fato é que estou livre do estranho objeto metálico de engrenagens rotativas obsessivas. Talvez só não o tenha espatifado porque – além de ser contra destruições –, não costumo despender esforços demasiados por pequenas coisas; não gasto minha energia com situações menores. Sabe aquela história de não se tentar matar um mero mosquito com uma bala de canhão? É isso: o reloginho não era tão importante que merecesse maiores atenções ou intenções de minha parte, nada que demandasse mais do que três ou quatro minutos. Apenas o abandonei num canto qualquer.
Na verdade, não tenho nada contra relógios. Quando criança, até os colecionava. Em 1982, aos 14 anos, eu tinha vinte e seis relógios, inclusive um mais que pós-moderno, rosa pink (acredita?), o máximo para a época... tsc tsc tsc (estou com síndrome de HQ)... Mas, voltando aos tais instrumentos cronológicos, eu me dou bem com eles essencialmente porque tenho uma ótima relação com o tempo. Sou apaixonada pela vida e, realmente, usufruo o que cada segundo pode me proporcionar; assim, lido com o tempo com toda a intensidade que me é peculiar. E – como todo humano mortal –, me utilizo de algumas formas para marcá-lo, procurando ajustá-lo às minhas necessidades de momento. Assim, nunca é cedo ou tarde para eu fazer determinada coisa; se é preciso fazê-la, fabrico ou manipulo tempo ou ocasião para a sua realização; se não dá para fazê-la durante a utilidade convencional do dia, providencio a ação para a noite, madrugada adentro... mas nada, absolutamente nada do que tenho a fazer, fica sem se realizar! Literalmente, não brinco em serviço.
De modo específico para acordar – como não costumo saudar a primeira face das manhãs, diga-se de passagem –, me utilizo de alguns “despertadores alternativos”: chamada 134 + dois celulares, tooodos tocando ao mesmo tempo! Assim, quando amanhece, todas as alvoradas de modernos galos eletrônicos retinem a meus ouvidos, abruptamente separados do onírico (meus vizinhos devem adorar!)... Mas a verdade é que eu nem preciso de tanto: tenho um despertador interno, supereficaz, que me chama no momento exato de despertar, uma intuição poderosa que não me deixa perder o compromisso. Tanto que, ao longo de toda a minha vida, poucas vezes perdi a hora, para o despertar... Na verdade, nem me lembro da última vez em que isso aconteceu.

Mas toda essa rotação de conteúdo em torno do instrumento de engrenagens robóticas trabalhando simultaneamente, por um breve instante de 30 segundos, me fez pensar no poder de Mister Chronos sobre a aventura humana. E aqui me ponho a um rápido retrospecto das buscas do homem através dos milênios: do original relógio de sol até os mais arrojados cronômetros atômicos, é impressionante a força devastadora do tempo, e igualmente instigante a nossa forma de vê-lo, dimensioná-lo e utilizá-lo com os melhores fins. Afinal, seja em que versão for, os marcadores temporais parecem dar-nos a dimensão exata do quanto é preciso nos empenharmos nesse sentido, do quanto necessitamos empreender para que o “nosso tempo” não passe em vão. Esse é um outro sentimento temporal que sempre tive: as contas que – sei – preciso ajustar com Mestre Tempo... Não coleciono mais relógios nem mesmo uso aquele convencional de pulso (desenvolvi alergia cutânea a seu uso constante), mas agora incumbo o celular de ser meu companheiro visionário das horas... 

Resta-nos agir com o que poderíamos chamar de consciência cronológica, a fim de satisfazermos as proposições do tempo, em seus arbítrios e movimentos irrecorríveis!
...tic tac, tic tac, tic tac, tic tac, tic tac...
Por Sayonara Salvioli
&&&
P.S.: Partindo de referência que fiz no texto, sugiro a leitura da história dos engenhosos implementos formatados por Santos Dumont e Louis Cartier, na fascinante Paris do começo do século XX.

19 comentários:

Anônimo disse...

Que interessante, Sayonara, a sua visão do Tempo quando era menina!! Muito legal! Com a sua descrição, a gente até parece ver o "poderoso senhor"...rs
Ótima crônica, como sempre!

Anônimo disse...

Engraçado e filosófico na medida certa o seu texto!!!!

Drica Parente disse...

É... o tempo é "irrecorrível" mesmo! A gente tem que aproveitá-lo o máximo!!
Também já tive coleção de relógios... Adorava!

Anônimo disse...

Gostei muito do tema da sua crônica. Tb li sobre Santos Dumont e o joalheiro. ótimo link!

Anônimo disse...

hilária a sua "aversão" ao reloginho... pelo visto vc não gosta dos despertadores comuns... prefere a sinfonia dos telefones! he, he

Anônimo disse...

O tempo é muito apressado mesmo. rsrs Temos que correr atrás dele!

Unknown disse...

Sayonara,
Adorei! Mas eu só queria saber uma coisa... essas balinhas tic-tac que mudam de sabor, como vc diz no texto, são aquelas da caixinha?
bjs.
Cintia.

Sayonara Salvioli disse...

Apenas para satisfazer à indagação da leitora Cíntia (juro que não é merchandising!): as balinhas a que me referi na crônica – apenas por serem “homônimas” da titularidade do texto, são as que todos conhecem, sim, aquelas da caixinha... São produtos da famosa doceria italiana Ferrero Rocher, a mesma que fabrica a deliciosa Nutella ( que também é recheio dos m-a-r-a-v-i-l-h-o-s-o-s bombons de avelã).
E a tal mudança progressiva de sabor, que também menciono no texto, se refere a uma sensação provocada pelas balinhas tic tac: elas têm aquele sabor refrescante duradouro e suave no final... Parece que é essa a explicação para o argumento. Mas nem sou “usuária” das tais balas (só era daquelas da banca do gordo... tsc tsc tsc)... Reafrmo que elas só apareceram na crônica por causa do nome: tic tac... Nada mais.
Contudo, as perguntas são sempre bem-vindas, Cíntia! Obrigada!

Unknown disse...

Legal, Sayonara. Mais legal anda é a história do seu relógio "tagarela"... Hilário! Parece que a gente vê você andando pela casa para dar sumiço nele... haha

Unknown disse...

o tempo é uma coisa intrigante mesmo... me amarro em física quântica!

Anônimo disse...

achei legal o que vc falou sobre não gastar energias à toa! show!

Anônimo disse...

Sayonara,
Sou professora de Literatura, e estou encantada com os seus textos! Eles têm muita personalidade, são fantásticos! Sua narrativa é um manancial imaginativo para o leitor! Adorei o presente com que nos brindou: aquele trecho do seu novo livro. Parabéns!

Mayane Eccard disse...

OI Sayonara. Parabéns pelo blog. De vez em quando eu passo aqui mas só hoje resolvi deixar a visita registrada. Eu não sou tão organizada quanto você. Tenho sentido o tempo escorrer entre os dedos, sem que depois me venha a sensação de ter aproveitado o momento. Faço listas das coisas que tenho que fazer, das pendências da vida, mas está difícil cumpri-las. Então, sua postagem é muito oportuna para mim. Achei interessante quando entrei no blog hoje e li a sobre os relógios. Justamente no feriado que passou eu estava pensando em comprar um despertador daqueles antigos, sabe? Depois de refletir o quanto os relógios não fazem parte da minha vida (eu sempre me guiei pela intuição de que você falou), cheguei à conclusão de que talvez eu precise de um. E coloquei mais um item na lista: comprar um relógio do tipo que faz tic-tac. Eu não tenho nenhum, nunca tive, nem de pulso, nem de parede, nem de colocar na estante. Atualmente, só intuição e celular. Acho que estou precisando ouvir aquele barulhinho como forma de me lembrar que o tempo não pára e, assim, tentar acompanhar o movimento da vida. Abraços.

Anônimo disse...

Muito boa a sua crônica!
Sabe, meu apartamento é cheio de relógios. Tenho até um bem antigo daqueles de pêndulo. De hora em hora, ele dá aquelas badaladas que parecem que vão despertar o mundo! Foi presente da minha avó, é lindo, mas às vezes ele até me assusta, sabia? O som é alto e eu tenho uma sensação de que ele é um censor, um tipo de fiscal que regula o nosso tempo... paranóia minha.. he,he
Bjs. Boas inspirações sempre pra vc!!

Anônimo disse...

eu tenho uma relação bacana com o tempo, parecida com a que o Mário Lago tinha: "nem ele me persegue, nem eu fujo dele"...

Unknown disse...

O tempo, quase sempre, é um oráculo, em vista do que fazemos com ele. Penso que o plantio vira mesmo colheita com o passar do tempo.

Entre letras disse...

Na maioria dos meus poemas falo sobre o tempo.Costumo dizer que o tempo é implacável.Não sei se vc conhece mas tem uma música do Pink Floyd (times) e Cazuza (o tempo não pára)ótimas.
Fragmentos que me chamaram atenção:
"juro que entendi a obsessão do capitão gancho"Tem situações que nos remete a coisas lá do fundo.òtima!!!!!!!!
"não gasto minha energia com situações menores"Se gastasse seria energia demais né.
"me dou bem com eles..."(tempo)
Organizada e prazerosa no que faz.
"é impressionante a força devastadorado tempo"Profunda e real.
òtimo o seu texto, parabéns, saúde e feilicidade p/ vc. Henrique

Prof.Paulo (Paulinho Campos) disse...

Sayonara querida,
essa coisa do tempo é instigante, inquietante nossa busca em tentar desvendá-lo... eu mesmo já fiz um sem número de canções tentando cercá-lo por todos os lados mas nunca consegui acompanhá-lo...No entanto você, masgistralmente acertou os ponteiros com ele!Aproveitando o mote: sua crônica está da hora!!!É uma senhora crônica; para ler sem preocupação de perder a hora, pois nos faz ganhar tempo viajando pela sua vida e suas visões!!!
Adorei demais mais uma vez:
Pa-ra-bénssss!!!
Um beijão literário desse seu amigo,
Paulinho.

Anônimo disse...

Até que enfim achei um tempo para ler suas novas crônicas. Gostei muito,como sempre.
Não vivo sem relógio!...mas o tic tac... às vezes incomoda.